Pobreza e morte: processos para permissão de morrer aumentam no Canadá


        Uma publicação do Jornal Extra Classe de 27 de dezembro de 2022 me fez parar para refletir e pesquisar sobre o direito de morrer que as pessoas têm ao adoecer gravemente. 

          Mas porquê isso, em meio às comemorações de fim de ano? - você poderia perguntar.

        Porque o sr. Amir Farsoud, de 54 anos, residente no Canadá, está pedindo o direito de fazer eustanásia por não ter condições financeiras para pagar seu aluguel. E essa é uma questão que merece  receber uma olhada bem mais longa. Farsoud é deficiente, recebe um auxílio governamental insuficiente para suas despesas, que incluem medicação, tratamentos,  transporte, alimentação e moradia. 

       O Canadá tem um sistema de saúde diferente para cada província e com autonomia para decidir o que é coberto pela assistência médica pública.

A pobreza não permite uma vida digna a Farsoud, que não quer morar na rua, nem sobrecarregar ninguém. Penso que ele muito menos quer morrer. 

          No Brasil, a eutanásia (morte assistida) ainda é ilegal,  enquadrada como homicídio  privilegiado, em meio a discusões de bioética sobre o direito de cada um de dispor de sua vida se enfrenta condições de dor e  indignidade física em doenças terminais.  

      A ortotanásia (cuidados que apenas minimizam o sofrimento até a cessação da vida a seu tempo) é melhor vista como frequente alternativa e facultativa ao doente.

          A legislação canadense, porém, é branda sobre pedidos de eutanásia e oferecida com gratuidade em processos dolorosos prolongados, quando não há mais cura viável. Mas correm por lá projetos de tornar a lei mais branda ainda, abrindo o leque de motivos para doenças mentais e quaisquer outras que causem desconforto continuado incapacitante. 

         A doença de Farsoud é também  ser pobre. Discussões religiosas e médicas, além da dos legisladores pró e contra a morte regulamentada, se intensificam com argumentos contrários entre si. E a eutanásia é permitida em vários paises.

         Outro caso canandense ocorreu em outubro e polemizou quando Sathya Kovac,  de 44 anos, foi atendida em seu pedido de morrer por não ter mais recussos para bancar tratamento para sua doença genética. No seu obituário foi escrito por amigos que ela viveria mais tempo se tivesse obtido a ajuda médica que necessitava. 

          Tenho sido apresentada à questão da necro-política recentemente como aquele viés  legislador que permite ao Estado gerenciar e priorizar quais são as vidas úteis que merecem ser cuidadas e quais as vidas dispensáveis na sociedade.  

          A morte é um destino irrevogável ao ser humano. A vida é um direito. O processo decisório de morrer quando não pode ser curado deve ficar nas mãos do paciente e de sua família - até porque para seu médico, orientador espiritual ou psicólogo seria um peso e um debate ético enorme. 

         O abandono familiar, a degeneração mental após longas doenças e o medo de não receber cuidados adequados são as principais causas de pedidos pela eutanásia no mundo (Montenegro, 2012, UNICEUB). 

        Mas Farsoud e Kovac me deixam com a pergunta: estamos falando da morte por indignidade causada por razão econômica?

        A pobreza impede o acesso dos cidadãos ao aparato hospitalar e à Medicina privativa. No Brasil adoecer e depender da rede pública de saúde poderia ser um portal para a impossibilidade de optar pela vida por parte do excluído? Este que já vive largado à própria sorte.

       Que quadro horrível teremos se o dever do Estado de cuidar da saúde dos cidadãos for menor que suas metas de bio-(necro)-política.

OBS: Cabe ao psicólogo, por a eutanásia considerada ilegal na legislação brasileira, a função de acolher os familiares e, principalmente, o paciente em sua subjetividade, resguardando ao máximo sua dignidade e respeitando, assim, o Código de Ética Profissional. (Carmona, Nunes e Fonseca, PUC-MG, 2011)

 (Texto de Rosemari Gonçalves (psicóloga CRP 16/6679)

Ilustração: Google

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